Em 2023, ter reservas como um camelo será o nome do jogo para as startups enfrentarem o deserto do cenário dos investimentos
Guilherme Azevedo, André Florence e Matheus Moraes, sócios-fundadores da Alice
, conteúdo exclusivo
5 min
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2 jan 2023
•
Atualizado: 19 mai 2023
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Calma pessoal, calma. O Startups não virou um site de notícias sobre horóscopo – na verdade, nenhum dos animais citados no título desta matéria sequer são signos. Contudo, a pergunta faz todo sentido para quem vai encarar o nebuloso e imprevisível mercado que 2023 deverá apresentar. Em um 2022 em que unicórnios tiveram dificuldades, e as startups camelo se tornaram um conceito real, fica a pergunta: 2023 será o ano das startups camelo ou unicórnio?
Para responder à pergunta acima, vamos primeiro falar dos unicórnios. Na última semana do ano passado, ainda na empolgação de 2021, que bateu recordes no venture capital brasileiro – e porque não, na preparação para um 2022 que já dava sinais de mudanças de humores – fizemos 7 apostas de nomes que tinham tudo para atingir o status em 2022. Foram elas: Alice, Beep, Cora, Descomplica, Kovi, Neon e Trybe.
Logo em janeiro, nossa previsão começou bem com o Neon levantando R$ 1,6 bilhão em fevereiro e carimbando sua entrada no clube. Depois disso, outra companhia, que não estava na nossa lista, conseguiu o feito: a também fintech Dock, que captou US$ 110 milhões em maio. E foi só.
Por outro lado, quem já tinha atingido o status também sofreu tendo que apertar o cinto e fazer layoffs. Facily, Loft e Quinto Andar são alguns exemplos. A própria Dock teve que demitir já que não ia conseguir fazer o seu almejado IPO.
A coisa ficou tão doida que teve companhia que teve que devolver o crachá de unicórnio na portaria e foi obrigada a se retirar da festa porque sofreu reavaliação para baixo de seu valuation. Criou-se, assim, a categoria dos DESunicórnios.
O nascimento de unicórnios caiu de 10 em 2021 para apenas 2 em 2022 no Brasil. Na América Latina, o número passou de 18 para 8. A queda da natalidade foi mais forte por estas bandas do que o percentual registrado globalmente, que ficou na casa dos 50%.
Unicórnios foram assim batizados por Aileen Lee da Cowboy Ventures por serem seres raros, o 1% do mercado. Mas com o excesso de liquidez dos últimos anos, se tornaram mais frequentes. Isso porque, com múltiplos dilatados (25x, 30x receita) e expectativas infladas, ficou mais “fácil” levantar US$ 200 milhões, número que, seguindo a prática de diluição de 20% até uma série A, corresponde a um valuation de US$ 1 bilhão.
Mas o que sobe tem que descer. E essa hora chegou em 2022. Os múltiplos caíram e ficou difícil justificar cheques tão altos para negócios que torram dinheiro para crescer e não têm um horizonte de equilíbrio de contas tão próximo. Essa compressão fez o nascimento dos unicórnios desacelerar.
Curiosamente, as mesmas pessoas que pregavam a cartilha do domínio do mercado, do crescimento acelerado, do blitzscalling, rapidamente se tornaram os defensores da sensatez, do comedimento. Coisas da vida.
Na visão de diversos analistas, 2023 será um ano em que unicórnios continuarão sendo raros e que os desunicórinos vão aumentar de número. “Ano que vem será bastante difícil. Não acredito que veremos muitos unicórnios surgindo”, afirmou Jonathan White, cofundador da Quona Capital, fundo norte-americano que já investiu em unicórnios brazucas, como a Creditas.
Segundo um levantamento divulgado pelo Pitchbook, as startups norte-americanas no Top 10% das rodadas no terceiro trimestre de 2021 perderam cerca de metade de seu valor. É uma realidade dura comparada ao período fértil que o mercado ianque teve no ano passado, quando cerca de 340 novos unicórnios foram criados no país – praticamente um unicórnio por dia, se cortarmos alguns fins de semana desta conta. No último trimestre, a média de rodadas ficou em comedidos US$ 71 milhões, uma queda de 29% em relação ao ainda aquecido primeiro trimestre de 22. E 2023 tende a seguir esse comportamento.
Se do lado dos investidores o novo cenário já está precificado, do lado dos fundadores e fundadoras, a ficha também começa a cair. Já está mais difícil ouvir as conversas sobre planos de se tornar unicórnio, algo que era uma constante nos tempos de abundância. Para quem acabou de começar, ou mesmo aqueles que viam suas empresas no caminho das polpudas rodadas de série B, C, D, ou esperavam o assédio de investidores em um IPO, o plano agora é outro. Sobreviver.
O termo não é novo (alguns artigos do setor já citaram a expressão lá em 2019), mas nunca se falou tanto sobre este animal do deserto quanto em 2022. Com a seca do venture capital, especialmente nas rodadas mais avançadas, muitas startups tiveram que parar de contar com futuras rodadas e se segurar com o caixa existente.
Por isso a analogia com o animal de duas corcovas, que guarda reserva de gordura (não de água) para aguentar longas viagens pelo deserto. E em 2023, ter reservas será o nome do jogo para enfrentar o deserto do cenário dos investimentos. Isso sem contar a disputa por capital que deve acontecer já que praticamente todo mundo estará com o chapéu na mão.
Para empresas que ainda gastam mais do que ganham, 2023 promete ser um ano complicado.
(Por Leandro Miguel Souza, publicado originalmente em Startups.com.br)
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