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Do protagonismo ao empreendedorismo: o futuro da liderança nas empresas

Quando a busca por visibilidade substitui o impacto real, organizações viram palco, mas só sobrevivem aquelas que formam líderes construtores, capazes de agir no escuro e pensar no coletivo.

Do protagonismo ao empreendedorismo: o futuro da liderança nas empresas

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22 min

26 ago 2025

Atualizado: 26 ago 2025

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1. Liderando por fotossíntese

Nos últimos anos, as empresas passaram a dizer que querem protagonistas em seus times. A expressão apareceu em descrições de vaga, discursos de liderança e manuais de cultura. A intenção era boa: motivar as pessoas a assumirem mais responsabilidade e autonomia.

Mas, na prática, abriu caminho para um efeito colateral silencioso — a criação de líderes que funcionam por fotossíntese. Precisam de luz para produzir energia. No escuro do trabalho invisível, murcham. No palco dos grandes projetos, florescem.

A palavra “protagonista” vem do grego protos (primeiro) e agonistes (lutador, competidor). Originalmente, designava o ator principal nas tragédias gregas, aquele que conduzia a narrativa no palco. O sentido literal carrega uma armadilha: quando importamos esse conceito para as empresas, colocamos o líder como personagem central de uma peça — e, inevitavelmente, todos os outros como coadjuvantes. O problema é que a vida real de uma organização não é teatro. Se cada líder se vê como protagonista absoluto, não sobra espaço para colaboração verdadeira, nem para a construção coletiva de soluções.

Quando empresas decidiram que precisavam de mais gente tomando iniciativa, acabaram confundindo proatividade com protagonismo. Proatividade é a disposição de agir antes que alguém peça. Protagonismo, no uso corriqueiro que se espalhou, virou a necessidade de estar no centro da narrativa. A primeira constrói resultado e autonomia. A segunda constrói personagem e dependência da plateia.

A transição simbólica do funcionário para o talento reforçou esse desvio. O termo funcionário, com seu peso de execução e disciplina, foi trocado pelo glamour de ser um talento, alguém único que mereceria espaço para brilhar. A autoestima subiu, mas o senso de sistema caiu. Cada indivíduo passou a se enxergar como uma estrela em busca de roteiro próprio.

Mas o problema é simples e estrutural: não existe holofote para todo mundo.

O protagonismo opera na lógica da escassez. Se a luz é limitada, cria-se silo, compartimenta-se decisão, protege-se orçamento e disputa-se a qualquer custo a chance de brilhar. O avanço do todo fica em segundo plano quando a narrativa pessoal precisa ser preservada.

“Quem cuida do emprego, não cuida da empresa” ouvi uma vez.

O ambiente corporativo que propagou a ideia de protagonismo fomentou então uma espécie de cultura do narcisismo. O foco deixou de ser o resultado coletivo e passou a ser a autopreservação. Defende-se território, métrica e verba. O trabalho em equipe é tolerado enquanto não ameaça a história individual.

O protagonismo torna a empresa apenas um palco de uma jornada individual. E nessa história, colegas de trabalho tornam-se apenas elenco de apoio.

Esse caldo produziu uma geração de líderes autocentrados e até muitas vezes mimados. Pessoas que cresceram amparadas por recursos, visibilidade e proteção desproporcionais. Preferem o palco que celebra conceito ao balcão que exige execução.

O efeito final é uma “Cultura dos Palcos” que fomenta relevância mais pela visibilidade do que pelo impacto necessário. Iniciativa extremamente importante mas que não geram visibilidade são preteridas, gerando atrasos nas transformações. Afinal resolver “encanamento entupido” ou “pintam paredes” não geram a mesma fama do que trocar a decoração da sala.

2. O alto Preço da Cultura do Palcos

O protagonismo mal interpretado não apenas distorce comportamentos individuais — ele corrói a lógica de priorização das empresas. Um levantamento da Deloitte com mais de 3 mil executivos mostrou que 62% dos líderes admitem priorizar projetos de alta visibilidade, mesmo que de impacto limitado, para aumentar sua relevância interna. Isso significa que a agenda corporativa está sendo guiada menos pelo que resolve o negócio e mais pelo que rende palco.

Esse viés tem custo real. Pesquisa da McKinsey indica que empresas que negligenciam projetos de infraestrutura invisível, melhorias operacionais, processos críticos e manutenção preventiva, gastam em média 18% a mais para corrigir problemas que poderiam ter sido evitados. Em outras palavras, enquanto se disputa o holofote, o encanamento segue vazando e a conta cresce.

O efeito colateral mais perigoso é o enfraquecimento do tecido organizacional. A disputa por visibilidade cria silos, protege territórios e dificulta a colaboração. Harvard Business Review aponta que organizações com altos níveis de competição interna improdutiva têm 30% mais rotatividade de talentos estratégicos. O problema não é falta de gente boa, é falta de gente disposta a jogar pelo time quando não há plateia.

Quando a energia de liderança é canalizada para preservar imagem, o risco se desloca: não é mais sobre errar uma decisão estratégica, é sobre não tomar decisões difíceis porque elas não rendem aplauso imediato. E em mercados cada vez mais rápidos, esse atraso silencioso custa caro, e às vezes custa a sobrevivência.

3. O Raio X do Protagonista Corporativo

O protagonista corporativo é fácil de identificar. Ele carrega traços recorrentes que, combinados, revelam uma prioridade clara: preservar a própria narrativa acima do impacto no todo. Entre os sintomas mais evidentes estão:

Agenda centrada em vitrine – Prioriza tarefas que rendem apresentação, evento ou anúncio. Trabalho estrutural e invisível fica sempre para depois.

Controle do fluxo de informação – Compartilha apenas o que reforça a própria imagem, filtrando ou atrasando dados que possam expor fragilidades.

Apropriação de crédito – Capitaliza vitórias coletivas como mérito pessoal e terceiriza fracassos para fatores externos ou para o time.

Orçamento como território – Trata verba como posse, protegendo escopo mesmo quando isso não maximiza valor para a empresa.

Colaboração condicional – Coopera apenas quando há palco compartilhado. Sem plateia, volta à lógica do silo.

Métrica escolhida a dedo – Seleciona indicadores que o favorecem, ignorando métricas que capturam o custo total da decisão.

Cliente como acessório – Usa a voz do cliente como argumento retórico, mas raramente se expõe ao contato direto para ouvir dores reais.

Esses comportamentos não surgem por acaso. Eles são estimulados por um ecossistema que premia mais a visibilidade do que o impacto. Três forças, em especial, sustentam essa engrenagem:

1. Distância da alta liderança – Em muitas empresas, o topo só aparece em fóruns seletos e ocasiões especiais. Essa ausência cotidiana cria uma economia interna da atenção: para ser visto, é preciso brilhar. Líderes passam a priorizar ações que gerem visibilidade imediata diante das raras aparições da alta gestão, cultivando a necessidade de “aparecer” nos momentos chave.

2. Sistema de promoção enviesado – As carreiras avançam mais rápido para quem domina o palco do que para quem resolve no bastidor. Profissionais consistentes, mas discretos, ficam à margem, enquanto os especialistas em autopromoção ocupam posições de influência, reforçando a lógica do brilho individual.

3. Narrativa do talento especial – Ao tratar cada líder como uma estrela insubstituível, a organização mina a cultura de execução compartilhada. O foco desloca-se do resultado coletivo para a autopreservação da trajetória pessoal. Recursos são blindados, informações são filtradas e riscos são evitados para que a imagem permaneça intacta.

O resultado é um ambiente com menos construtores e mais atores, onde a energia se concentra em encenações internas e disputas por visibilidade. As prioridades deixam de ser definidas pela urgência do cliente ou pela necessidade da operação e passam a ser moldadas pelo calendário de eventos e fóruns internos.

Em um mercado que exige ajustes diários, capacidade de resposta rápida e decisões fundamentadas no que acontece no chão da operação, o palco raramente é o lugar onde a transformação real acontece. Ele serve para exibir conquistas já vencidas, enquanto os verdadeiros avanços , aqueles que garantem competitividade e sustentam o futuro , nascem e amadurecem longe dos holofotes.

4. Liderança Empreendedora

O antídoto para o protagonismo tóxico não é reduzir visibilidade, mas mudar a natureza do que valorizamos. Hoje, muitas empresas ainda operam presas a um padrão de líder protagonista e precisam migrar para um padrão de líderes empreendedores: aqueles que constroem o palco, testam o som, ajustam a luz e garantem que a peça continue mesmo sem aplausos.

O líder protagonista escolhe projetos pelo potencial de visibilidade; o líder empreendedor escolhe pelo potencial de impacto. O protagonista evita trabalhos que não rendem manchete; o empreendedor resolve o encanamento que ninguém vê, mas que sustenta toda a peça. O protagonista pensa na próxima promoção; o empreendedor pensa no próximo degrau que a empresa precisa subir, mesmo que ele não esteja lá para receber o crédito.

O líder empreendedor não precisa de motivação, ele é comprometido.

Entende que a grandeza de um projeto está no valor que entrega para clientes, equipes e resultados sustentáveis, não na atenção que gera para si. Respeita o dinheiro da empresa como se fosse seu, adia recompensas quando necessário e não evita assumir tarefas pesadas ou impopulares que mantêm a engrenagem funcionando. Ele sabe que muitas das vitórias mais importantes não têm foto, mas deixam um rastro de melhoria permanente.

Sete características de um líder empreendedor:

Escolhe impacto antes de visibilidade – Prioriza projetos que resolvem problemas estruturais ou liberam potencial para o futuro, mesmo que ninguém perceba de imediato.

Assume o trabalho invisível – Não evita tarefas sem glamour, como corrigir processos, padronizar rotinas ou lidar com crises silenciosas.

Divide o palco e o crédito – Reconhece publicamente o mérito do time e parceiros, valorizando as conquistas coletivas mais do que a própria exposição.

Gasta como se fosse dono – Trata recursos da empresa com zelo, questiona custos desnecessários e busca retorno tangível antes de expandir.

Se expõe ao cliente real – Mantém contato direto com clientes e usuários para entender necessidades e validar decisões, em vez de depender apenas de relatórios.

Toma decisões que sobrevivem a ele – Pensa no legado e estrutura soluções que continuem funcionando mesmo quando não estiver mais à frente.

Cria autonomia no time – Desenvolve pessoas para que tomem decisões relevantes sozinhas, aumentando a velocidade e a capacidade de execução da organização.


Ninguém precisa ser dono da empresa para agir com dono. Essa uma das bobagens que o ressentidos espalham por ai. Não vou agir como dono sem ser dono. A liderança que empreende, transforma “o seu quadrado” em um pequeno empreendimento. E por fazer isso ode forma consistente acaba por tornar-se dona de algo no futuro. Ser dono é mais sobre comportamento do que sobre contrato social.

5. Como criar uma cultura de líderes empreendedores

Transformar uma organização de protagonistas em um ecossistema de líderes empreendedores não é questão de discurso inspirador, mas de engenharia cultural: redefinir métricas, rever incentivos, valorizar o impacto invisível e proteger quem escolhe servir ao todo em vez de competir pela luz.

É uma escolha de liderança que exige coragem, porque desafia quem aprendeu a viver de palco, mas salva a empresa de se tornar apenas mais um espetáculo que termina quando as luzes se apagam.

Criar líderes empreendedores é mais do que ensinar técnicas de gestão. É construir um ambiente onde as pessoas pensem e ajam como donas do negócio, tomem decisões que favoreçam o todo e aceitem responsabilidades que vão além do próprio cargo. Isso exige clareza estratégica, proximidade com o cliente, incentivos alinhados ao coletivo, autonomia real e espaço para experimentar.

1. Trocar controle por clareza
Líderes empreendedores não precisam que alguém dite cada passo, mas precisam de um norte cristalino. Quando a liderança substitui microgestão por clareza estratégica, abre espaço para a autonomia responsável. O controle excessivo mata a iniciativa; a clareza sobre objetivos, métricas e restrições a potencializa.
Exemplo: A Netflix define poucos objetivos chave anuais e dá liberdade para que cada time escolha como alcançá-los, mantendo foco em resultados. A Toyota faz o mesmo no sistema Hoshin Kanri, alinhando metas corporativas com autonomia local para definir métodos.

2. Trazer o cliente para dentro das decisões
Empreendedores internos raciocinam a partir da experiência real do cliente. Criar contato direto, recorrente e intencional com o usuário final impede decisões baseadas em métricas artificiais e mantém a empresa conectada à realidade.
Exemplo: A Southwest Airlines exige que líderes passem períodos atendendo clientes em aeroportos para entender a operação real. A Zappos mantém todos os novos funcionários, inclusive executivos, duas semanas no atendimento para absorver a cultura de serviço.

3. Criar incentivos que premiem o coletivo
Um sistema de recompensa individualista reforça silos e disputas por luz. Para formar líderes empreendedores, parte da remuneração precisa estar atrelada ao sucesso conjunto de áreas e projetos interdependentes.
Exemplo: A Salesforce vincula bônus de líderes a métricas conjuntas de satisfação do cliente e vendas cruzadas entre áreas. A Unilever usa metas coletivas ligadas a sustentabilidade e eficiência para determinar parte da remuneração variável.

4. Dar autoridade para decidir com o próprio orçamento
Autonomia sem poder sobre recursos é um jogo de faz de conta. Dar acesso a um orçamento controlado cria senso de dono e acelera respostas a oportunidades ou problemas.
Exemplo: A 3M permite que cientistas e engenheiros usem parte do orçamento para projetos próprios, desde que apresentem retorno. A Ritz Carlton autoriza cada funcionário a gastar até dois mil dólares para resolver um problema de cliente sem precisar de aprovação superior.

5. Incentivar experimentação com responsabilidade
O empreendedorismo interno floresce quando arriscar não é punido, mas deixar de aprender é. Criar uma cultura onde experimentar é esperado e onde fracassos são analisados, não escondidos, desenvolve líderes com coragem para inovar.
Exemplo: O Google mantém o programa de vinte por cento do tempo para que funcionários dediquem parte da jornada a projetos paralelos de inovação. A Amazon incentiva experimentos reversos, pequenos testes para validar hipóteses antes de grandes investimentos, com ciclos rápidos de avaliação.

Criar essa cultura não acontece por decreto. É um trabalho contínuo de reforço de comportamentos e realinhamento de incentivos, onde cada decisão de liderança deve transmitir a mensagem de que o objetivo não é ter mais protagonistas disputando luz, mas mais empreendedores construindo resultados que sustentam a organização no longo prazo.

6. Conclusão: Empreendendo o futuro

Não é o protagonismo que vai transformar as empresas. É o empreendedorismo interno. O palco do protagonista é iluminado pelo brilho da própria carreira; o campo do empreendedor é iluminado pelo resultado coletivo. E se o que está em jogo é a sobrevivência e a reinvenção de um negócio, precisamos menos de atores disputando luz e mais de construtores assumindo responsabilidade pelo futuro.

O protagonista quer escrever o próximo capítulo da sua história pessoal. O empreendedor quer escrever o próximo capítulo da empresa. O protagonista mede sucesso pela visibilidade que conquista; o empreendedor mede pelo legado que deixa.

Organizações que apostam apenas em protagonistas acumulam apresentações impecáveis, mas resultados frágeis. Organizações que apostam em empreendedores constroem estruturas sólidas, processos resilientes e culturas capazes de se adaptar continuamente.

O desafio está em entender que transformar o futuro não é uma questão de quem fala mais alto nas reuniões ou aparece mais nos eventos. É sobre quem cria soluções que permanecem, quem ajusta o curso diariamente, quem se envolve com os problemas invisíveis e toma decisões que geram impacto real.

O futuro das empresas será decidido não por quem corre atrás da luz, mas por quem aprende a trabalhar no escuro. É quando ninguém está olhando que os problemas mais críticos são resolvidos, que a confiança se consolida e que o valor real é criado.

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Experiente Diretor de Marketing, Inovação e Estratégia com um histórico comprovado em vários indústrias. Hábil em Gestão de Marketing, Planejamento de Mercado, Planejamento Estratégico, Customer Marketing, Inovação e Transformação Digital.

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